Hé uma lacuna de educação financeira no p s
Para a planejadora financeira e colunista da Folha, Marcia Dessen, falar do próprio dinheiro é um tabu permanente para o brasileiro. “Até hoje, ninguém tem coragem de perguntar quanto um amigo ou parente ganha. E, quando pergunta, tem de ouvir que não tem nada a ver com isso”, brinca. Para tentar mudar pelo menos parte dessa mentalidade, Marcia acaba de lançar o livro “Cuide Bem do Seu Dinheiro”, reunindo artigos escritos por ela em suas colunas publicadas no jornal durante dois anos –atualizados e reorganizados. Segundo a autora, a chave para um bolso saudável é o equilíbrio: gastar de forma consciente, mas sem abdicar do bem-estar que o dinheiro proporciona. Leia entrevista.
Folha – O que é “cuidar bem do seu dinheiro”?
Marcia Dessen – É planejar. O planejamento permite que a pessoa ou a família aloque dinheiro de acordo com suas necessidades. Porque raramente a gente tem dinheiro para fazer tudo o que quer. Então, se não houver planejamento para determinar o que é prioridade, as pessoas acabarão gastando mais do que ganham. Esse é o primeiro grande problema.
É preciso saber economia para ter boa saúde financeira?
Nem um pouco. Só é preciso ter muita disciplina, autocontrole e convicção naquilo que o indivíduo ou a família entende que é prioridade. Mesmo para conhecer as diversas modalidades de crédito que existem não é preciso entender de economia. Nem na hora de investir ou comprar qualquer produto financeiro. Você só precisa ficar atento em entender o que está comprando.
As pessoas têm vergonha de falar de dinheiro? Por quê?
Falo no livro sobre esse tabu. Costumo dizer que há pouco tempo tínhamos dois grandes tabus: dinheiro e sexo. Aprendemos a falar de sexo por causa da Aids, por questão de preservação da vida. Infelizmente, percebo um avanço ainda muito tímido na pauta de saúde financeira.
Esse tabu contribui para que o brasileiro seja tão endividado?
Em parte. Mas acho que dívida não é ruim. O ruim é dívida tomada sem planejamento. Sabe o que acho que causa hoje tanta inadimplência? Os dois principais créditos que o brasileiro toma são exatamente os que deveria evitar: cartão de crédito e cheque especial, que são caríssimos. Até escrevi explicando que a razão para isso pode ser simples: vergonha. É muito desagradável entrar num banco, sentar na frente do gerente e ter que pedir dinheiro emprestado. Mais desagradável ainda é ter que pedir para um fiador, para um parente ou amigo ser avalista.
Há uma lacuna de educação financeira em escolas e universidades?
Existe. Hoje há o Enef [Estratégia Nacional de Educação Financeira], mas ainda é um movimento relativamente recente, um embrião para levar a educação financeira a todos os níveis. Já tive oportunidade de falar sobre o tema em alguns núcleos de escolas, universidades e em empresas privadas. E a reação das pessoas é sempre muito positiva.
Existe hoje a percepção de que os jovens estão menos interessada em acumular patrimônio e mais em consumir. Como isso influencia o planejamento?
Muda totalmente. Tudo precisa ser repensado a partir da perspectiva do consumo. E acho isso saudável. Os jovens estão “vivendo a vida”. Que bom! Quando falo em planejar, não quero que ninguém se prive. É o famoso “eu mereço”. O dinheiro é seu! É uma reflexão que o planejamento permite fazer.
A aposentadoria é o desafio central da atual geração?
Com certeza. A boa notícia é que a gente está vivendo mais. A má é que é preciso dinheiro para financiar essa sobrevida. Então, aumenta a importância do planejamento financeiro. E só há uma saída, na verdade: começar a poupar para velhice muito mais cedo ou poupar mais dinheiro por mês.
Fonte: Boainformacao.com.br