10/05/13
Educação financeira come a na infé ncia
Bonecas, roupas, jogos e aparelhos eletrônicos, um chocolate no bar da escola. As tentações do mundo do consumo fazem parte da rotina infantil, e os apelos são cada vez mais constantes entre as crianças. Se para muitos adultos lidar com o dinheiro e as finanças já é uma tarefa complicada, ensinar os pequenos lidar com os limites das compras pode ser ainda mais difícil.
INFOGRÁFICO: Administre sua mesada
Por mais que os pais queiram escolher o melhor momento para abordar o assunto com as crianças, a percepção dos pequenos sobre o dinheiro já começa a ser formada antes mesmo de o tema entrar em pauta.
— Mesmo que você não fale diretamente com as crianças sobre as finanças, o assunto já está inserido no contexto familiar desde sempre. Elas observam os pais, a maneira como eles lidam com o dinheiro, o poder e as aquisições. A educação financeira não está isolada da educação global e deve, portanto, ser considerada desde o princípio — explica a psicóloga e terapeuta familiar Maria Alice Targa.
As primeiras lições começam nas atitudes simples do cotidiano. As recomendações de não deixar a torneira aberta ao escovar os dentes, apagar a luz ao sair da sala ou não desperdiçar comida no prato mostram aos pequenos que mesmo as coisas mais fundamentais de uma casa devem ser valorizadas, preservadas e, claro, precisam ser pagas.
— É importante dar às crianças a consciência de que nada vem do céu. Há pesquisas que comprovam essa ideia: se você não explica que muitas coisas na vida têm um custo, elas pensam que "foi papai do céu quem deu" — esclarece o economista Alfredo Meneguetti, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Negociação e paciência são importantes para domar os ímpetos consumistas das crianças
As compras da família Von Hohendorff, de Ivoti, são sempre acompanhadas pela filha Isabele, 11 anos. Desde pequena, ela está inserida na rotina financeira dos pais, o advogado Daniel e a arquiteta Liziane. No supermercado, tudo é negociado.
— Fazemos as contas juntos: se trocarmos essa marca de iogurte pela outra, o que podemos comprar com a diferença? Assim vamos negociando e ela vai aprendendo a administrar as finanças — conta Daniel.
Hoje, Isabele já faz suas próprias compras administra uma mesada, mas sua responsabilidade com o dinheiro foi inserida aos poucos, sempre com base em bons exemplos e muita conversa.
— No começo pode até ser um pouco complicado, mas os ganhos são muito grandes. É claro que é mais fácil passar o cartão de crédito e dar aquilo que a criança pede, mas a gente fala tanto em ecologia e sustentabilidade e vai criar um consumista dentro de casa? — indaga Daniel.
E não é somente em casa que Isabele aprende sobre finanças. No colégio em que ela estuda, o Instituto de Educação Ivoti, a educação financeira faz parte do currículo há mais de 10 anos. Desde as séries iniciais, os professores desenvolvem atividades que incentivam o hábito de economizar. A turma do 5º ano tem até caderneta de poupança própria.
— Os alunos foram até o banco fazer a abertura da conta. Semanalmente, em sala de aula, eles guardam um dinheiro em um porquinho e, no final do mês, fazemos o depósito. Acompanhamos todos os rendimentos, as correções monetárias e, com o valor acumulado, fazemos passeios ou compramos algo para todos — explica a professora Débora Regina Nunes.
E quando a grana está curta?
Os desejos de consumo das crianças costumam aparecer com mais frequência quando elas começam a se socializar, e o desejo de ter o mesmo que o amiguinho é despertado. Se as finanças da família estão apertadas e não permitem comprar algo que é muito desejado e valorizado pela criança, a negociação entra em cena.
— A conversa é o ponto principal nesse momento. Você negocia, explica que é preciso esperar, que o pagamento será feito aos poucos. As crianças precisam ter a noção que existem outras prioridades nas finanças da família e que não se pode ter tudo no momento em que se quer — explica a psicóloga e terapeuta familiar Maria Alice Targa.
A frustração é inevitável e, mais do que isso, fundamental. Ela ajuda a valorizar as conquistas, a lidar com as limitações da vida e a alimentar os desejos e as aspirações.
— O não bem dito e explicado sempre traz um ganho. As crianças que têm menos, que almejam e que esperam costumam ter menos episódios depressivos em suas vidas. Quem tem tudo não deseja nada e não valoriza nada.
Lições de economia infantil
O economista Alfredo Meneguetti mostra as cinco lições que podem ajudar os pais a falar sobre finanças com as crianças. Confira:
1. Mostre para as crianças que as coisas que ela têm em casa não são dadas, que há um custo diário para manter a vida funcionando. Explique que a água da torneira e a luz da sala são pagas pelos pais e, portanto, precisam ser economizadas.
2. A partir dos seis ou sete anos, a criança deve acompanhar os pais nas compras do supermercado. Explique o custo dos produtos, mostre o quanto se gasta para comprar a carne, a massa, o leite. Assim, ela vai assimilando os valores.
3. Nesta mesma idade, comece a dar algum dinheiro semanalmente para a criança. Pode ser um valor pequeno, de R$ 15. Ela vai administrar essa quantia e perceber que, se gastar tudo no mesmo dia, não terá mais depois.
4. Compre um porquinho para que a criança possa ter uma poupança ao começar a administrar seu dinheiro. Este é um recurso antigo e pouco usado atualmente, mas muito eficaz, pois o valor depositado nele não pode mais ser usado quando quiser. Essa distância do dinheiro é importante.
5. Estabeleça metas com as crianças, seja de uma quantia a ser economizada ou de alguma compra. Os pais devem construir e realizar os sonhos com as crianças, fazendo com que elas participem desse processo.