Dinheiro na mão não precisa ser vendaval
No Brasil, mais de 62,9 milhões de pessoas estão com o nome sujo por conta de dívidas em atraso. Os dados são de pesquisa divulgada esta semana pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), mostrando que mais de 43% da população adulta está inadimplente. O planejador financeiro da Ouroinvest, Mauro Calil, explica que, apesar da crise econômica – que deixou um saldo de mais de 13 milhões de desempregados no País- seja o principal motor deste cenário, o endividamento das famílias já vinha em patamar alto bem antes da recessão. “Houve um incentivo ao consumo desmesurado. O modelo de desenvolvimento econômico no Brasil era baseado no endividamento das famílias”, observa.
Ele diz que os efeitos do descontrole financeiro vão além das restrições ao crédito. Em muitos casos, pode trazer estresse, insônia, depressão, problemas de relacionamento e de produtividade no trabalho.
A diarista Luiza Salvador, 41, sabe bem como é estar com as contas no vermelho. Ela conta que a vida sempre foi difícil, mas a situação apertou conforme as diárias foram diminuindo. “Eu mal recebo dinheiro e o banco já come quase tudo. Eu já nem durmo direito”, relata.
Reverter esta condição de vulnerabilidade econômica da população é um grande desafio para o Brasil, pois se trata de um ciclo vicioso: afeta a rotina de pessoas como a Luiza, das empresas a quem a diarista deve e toda a cadeia produtiva, que poderia estar vendendo novos produtos e aumentando o ritmo de produção e contratações. O Governo também passa a arrecadar menos.
Desde 2010, a Associação de Educação Financeira do Brasil (AEF), organização social criada para executar a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), buscado mecanismos para disseminar a cultura de educação financeira no País.
Com o apoio dos Ministério da Fazenda e do Desenvolvimento Social, além do patrocínio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e da Citi Foundation, já foram criadas 43 tecnologias sociais.
Entre os programas, está o de Educação Financeira para Adultos, criado em 2016, com foco em aposentados com renda de até dois salários mínimos e mulheres beneficiárias do Bolsa Família. Mais de 3,5 mil pessoas foram beneficiadas em 15 municípios, incluindo cidades do Ceará.
A superintendente da AEF, Cláudia Forte, explica que, com o acompanhamento dos hábitos de consumo e o ensino de novas práticas, o percentual das beneficiárias do Bolsa Família que conseguiram formar uma poupança para crises e emergências, que no início do projeto era de 23%, passou para 38%. O valor médio mensal inicialmente poupado saltou de R$ 12,40 para R$ 37,10.”Para quem está desempregado, fica mais difícil, mas é possível criar oportunidades. É preciso lidar com fatos”, afirma.
Entre os aposentados, a redução do número de inadimplentes caiu de 21% para 9% depois de participarem das oficinas do projeto. E 91% passaram a pagar suas dívidas, número que antes chegava a 77%. “Isso é maravilhoso, porque no Brasil mais de 70% dos aposentados com até dois salários mínimos estão em condição de superendividamento”, alerta.