Seu filho já pagou algum boleto?
A primeira vez que tive contato com educação financeira foi em 2002, quando fui voluntária em uma ONG dando aulas de economia pessoal para alunos de uma escola pública de São Paulo. Era uma turma do sétimo ano do ensino fundamental e nesse curso eles aprendiam o básico sobre orçamento financeiro pessoal e familiar e as vantagens e desvantagens do crédito, além de explorarem opções de carreira e descobrirem o valor da educação.
Me lembro de chegar no primeiro dia de aula mais assustada do que no meu primeiro dia de trabalho no mercado financeiro. Era uma mistura de ansiedade por nunca ter dado uma aula antes, e curiosidade sobre como seria o engajamento daquelas crianças com o tema. Coloquei o medo na sacola, respirei fundo e mergulhei de cabeça naquela incrível experiência. O que eu não imaginava era que, poucos anos mais tarde, a educação financeira se tornaria para mim uma profissão.
Aqueles jovens, vindos de realidades tão distintas, tinham um ponto em comum: o sonho de se tornarem pessoas financeiramente mais prósperas. Minha missão ali era mostrar caminhos e ferramentas para viabilizar essa conquista.
Dentre as dez aulas que ministrei para essa turma, uma delas me chamou atenção pela curiosidade e engajamento das crianças. Apesar de muitas terem clareza da realidade financeira de suas famílias – e uma minoria até mesmo já trabalhava para ajudar no sustento da casa – elas não tinham a menor ideia do que era (ou para que servia) um caixa eletrônico, o internet banking, uma conta corrente, um talão de cheques (muito comum e utilizado na época) ou mesmo um boleto.
A dinâmica proposta por mim para a turma era de simular o ambiente de uma agência bancária, para que pudessem receber e pagar contas, descontar cheques e sacar dinheiro em um caixa eletrônico. Foi uma educativa simulação do mundo real.
Passados quase vinte anos dessa minha primeira experiência, vejo ainda a alienação das crianças e dos jovens sobre práticas tão corriqueiras do cotidiano de qualquer cidadão.
Ensinar para os filhos o valor e o significado do dinheiro, ou a importância de se ter uma vida financeira saudável, passa por ensiná-los a utilizar os recursos disponíveis de forma lúdica e aplicada. Hoje em dia qualquer criança é um nativo digital que domina aplicativos e jogos eletrônicos dos mais diversos com uma invejável destreza. Contudo, essa mesma criança certamente não tem a menor ideia para que serve o aplicativo ou o internet banking de uma instituição financeira.
E é aí que mora uma grande oportunidade de mostrar para os filhos que dinheiro não nasce na ATM, que cartão de crédito não é um pedaço de plástico milagroso (que você passa e, do nada, seu sonho se realiza) e que aquele tanto de papéis que chegam em casa todos os meses é muito mais do que uma agressão ao meio ambiente.
Contextualizar as teorias é um ótimo processo educativo. Experimente convidar os filhos para navegarem no app do banco, apresentando e explicando a utilidade de cada funcionalidade. Envolva-os nas rotinas mais simples, como a conferência do extrato bancário ou o saldo em um investimento. Ensine o processo que o seu dinheiro percorre quando uma compra é paga com cartão de crédito e os alfabetize nas ferramentas que serão manejadas por eles em um futuro bem próximo. Fazer isso é aproximá-los do mundo real.
Eles podem até não precisar tão cedo pagar um boleto, mas certamente entenderão de onde vem, para o que serve e a importância de pagá-lo em dia.
Fonte: Valor Investe